domingo, 6 de junho de 2010

E naquele mesmo ar, antes se respirava Magnólia.

“Uma alameda delas, embaixo da minha janela”.

Era o que Ana dizia quando lhe perguntavam sobre a fotografia na parede ou sobre a infância em Belo Horizonte. Quando completou 12 anos, seus pais lhe deram de presente uma câmera fotográfica e a notícia de que em breve se mudariam para o Rio de Janeiro. Há quase um mês, o pai, Antônio, cumpria aviso prévio numa pequena indústria automotiva local. O irmão, recém-empreiteiro, o havia chamado para trabalhar na cidade dizendo que “nunca falta dinheiro para construção civil”. A mãe, Carolina, que a princípio nem se permitia falar do assunto, a essa altura resignara-se. Chorou durante duas semanas inteiras e até o momento da mudança quase não falou com o marido. Justificou-se pela venda da casa dos pais, herança dela e de Ana, mas todos sabiam de que o desgosto era por desconfiança da boa fé do cunhado. Enquanto isso, Ana fotografava as magnólias. Até pediu ao barbeiro que fizesse uma foto sua ao lado de uma delas. Despediu-se das amigas da escola, da moça da confeitaria, das cores do amontoado de lojinhas que davam ao bairro a impressão de ser uma cidade pequena dentro de outra maiorzinha. E em janeiro daquele ano, mudaram-se.

Foram morar em Lins de Vasconcelos, numa casa pequena de dois quartos. A foto das magnólias metida num porta-retrato barato era para Ana motivo de orgulho e argumento para fazer novas amizades. Na primeira semana de aula, levou as coleguinhas da escola para conhecer a cidade jardim de que tanto falara. Quando o tio que não conhecia foi fazer a primeira visita, foi ela quem fez sala e o levou pela mão até o quarto para ver o retrato. Ele viu como a menina era bonita apesar de um pouco franzina para a idade. Passou a almoçar todos os dias com a família. Dona Carolina não gostava da maneira como ele se interessava pelo dia-a-dia da menina. Chegou a comentar com o marido sobre as perguntas da escola, dos amigos, das brincadeiras, das preferências; mas este lhe respondia que devia ser para tentar agradá-la e que ela devia parar de ver os outros com os olhos tão ruins.

Era quase Carnaval. A perspectiva de estar ali, nesta época do ano, fazia Ana transbordar de excitação e ansiedade. Falava nisso desde sempre e pediu à mãe que lhe fizesse uma fantasia “de moça”. Ela achou graça ver a filha tão crescida.

O vestido de paetês cor-de-rosa dançava no seu corpinho pequeno e magro enquanto pulava na frente do pai tentando convencê-lo. Antônio, que não era muito de Carnaval, disse que tirou o feriado para descansar e Carolina reclamou que estava apertada demais terminando a costura para fora, mas Ana insistiu tanto e estava tão animada que, a contragosto, acabaram deixando que o tio a levasse para ver a festa.

Naquela noite Ana fingiu que era uma flor de magnólia.

Ainda era março quando caiu, desflorada.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Bruna e Pedro, cansados de adiar o passeio, decidiram acordar cedo e encontraram-se na padaria para um café a dois que só pretendia. Como se sabe, há uns que caminham para chegar a qualquer lugar, mas, há sempre aqueles que resolvem caminhar descansados. Eram destes. Vieram os jardins mas o palácio estava fechado. E o outro que havia não deixava entrar rapazes de bermuda. Quanta diferença não fazia um cachecol no mês de junho, não? E para comemorar ela decidiu ir à um café. Efêmero demais, ele disse. Como todas as coisas boas. E por pouco ele quase não bebeu um pouquinho. E então tiveram aquela pausa para as fotos. (Aqui, quem os conhece que o diga, é coisa que sempre convinha dado o modo como o romance se deu). Nesta hora já passava do meio dia. Para ele, ela já não era mais pernóstica; e ela não se incomodava tanto com as garçonetes. De todo modo, ainda bem que o amor não tem adjetivo, pensaram juntos enquanto subiam as escadarias do prédio desejando a tarde que mal começara.