domingo, 28 de junho de 2009

Depois do encontro

Disse, precisamos conversar.

Assenti.

Sem reconhecer a quem, falei

e deixei que viesse a chuva, e lavasse o corpo in[]teiro

(os olhos não viam porque a chuva não é nítida)

o amor ocupou apenas os intervalos de silêncio inconsútil

e assim mesmo,um àrvore – outro pássaro, ficamos]

Não tristes,

mas melancólicos.

(A diferença está no prazer que se tem)

Pequenez

I-I
aos auSSentes


Sinto-me minúscula.
(é um estado de Letra)
Alguém me disse que o texto modificou o corpo dos homens - acredito.

Ana

II

Ana

Ana teorizava sobre o amor enquanto procurava pelo seu, sem encontrar e todavida. Certo dia, pensando que, talvez, pudesse ser o simpático rapaz do moinho a trazer-lhe flores a janela, arranjou-se em seu melhor vestido e foi pass(e)ar por ele até que ele a notasse. Na primeira ela se distraiu, na segunda se envergonhou, na terceira desconversou e só então, ele convidou a entrar e tomar chá. "Vestido é tiro e queda" pensou, e do convite, achou cortês. Sentaram e falaram. Falaram sobre o campo, sobre o tempo, sobre o moinho, sobre eles mesmos e sobre os outros. Cansaram e calaram. Despediram-se sem reservas. Ela foi para casa e ele foi para dentro. Uma quarta-feira mais tarde recebeu num bilhete outro convite: Desta vez, nada de chá, girassóis! Ana desempoleirou-se e do armário tirou outro vestido, mais adequado as tardes de quarta-feira. Despediu-se da mãe com a desculpa de quem não tem e pôs-se a caminho. ( A outra Ana gostou da falta de jeito do menino). Encontraram-se na metade__ e ele estava cheirando a banho. No fim da tarde os girassóis ficavam maiores e mais vermelhos e depois, escureciam. Ela aceitou o namoro achando que o amor era mais, mas que o mais era porque crescia. Passou então a frequentar o moinho. Ele, que nunca achou nada do amor, gostava dos vestidos. E amava.

(Somente mais tarde é que ele diria que vestido vermelho só não vê quem não quer, sem medo de maiores retaliações).

De um encontro - ainda adiado

I
De um encontro (ainda adiado)

Pressentindo o equívoco inevitável, dispôs-se a reparar o erro. O caminho lento e rítmico doía-lhe as costas, ou talvez fosse a distância. Pensou em escrever, como nos melhores romances, mas a ansiedade incomodava-lhe a torto e direito. Não tinha muita paciência embora assim a julgassem (graças aos seus traços sutis e porte elegante-curvilíneo). Era novembro, o vento soprava dispersando as nuvens - frio. O sol empalidecia em matizes amarelas e alaranjadas. Os contornos eram belos. Não sem entusiasmo pensara no encontro sob aquela luz, pensara no que diria e nas possíveis reações. Não sem agonia pensara em adiá-la ao máximo, e assim saborear cada segundo, sem maiores conseqüências. Não sem medo, pensara no não. Não sem recortes, pensara na volta, caso a fizesse sozinha. Uma mulher se contorcia dentro dela e do lado de fora, apenas suspirava. Não lhe negaria amor plenamente e não lhe negaria catarses. Manejaria, entre risos e dores, uma liberdade dupla e estariam enlaçados por este único vínculo afetivo e mutável, ao qual cuidariam como a uma semente e esta lhe agradeceria dando os frutos que lhe coubesse e nada mais. E fossem grandes fortes suculentos saudáveis duradouros ou fossem minguados secos ocos fracos e frágeis ao primeiro inverno, iria amá-los como ao homem, como a si e como a todo amor que conhecia. Entrou no primeiro trem para contar isso a ele. Para pedir que esperasse por ela, que entendesse, que compartilhasse e soubesse aproveitar tudo isso que lhe pertencia- e a ele apenas - sem destruir a parte que era dela- e dela somente.

( Existem coisas no amor que só cabem guardar ao coração de uma mulher).

Nau Frágil

I
Nau Frágil

à Hilda Hilst


oco
flutuava a imensidão
sem sentir o corpo
sem sentir o peso

como um corte
a ausência
a medida
estilhaça

denso
sem lugar terno
sob a luz
desloca- se
mar adentro
cinco tons abaixo

a profundidade
intacta
do negro azul
não desponta
quando
o sol
irrompe
a superfície esverdeada